
O número de brasileiros com acesso à internet aumentou. É fato. Mas basta sair um pouco do centro para perceber que a inclusão digital, na prática, continua capenga.
Segundo a nova edição da pesquisa TIC Domicílios, divulgada nesta semana, mais casas passaram a ter internet, especialmente entre os mais pobres. Mas isso não quer dizer que todos estão realmente incluídos no mundo digital.
Nas classes D e E, 73% dos domicílios estão conectados. Há dez anos, essa proporção era de míseros 16%. A diferença para a classe A, que já atingiu 100%, caiu bastante. Porém, uma conexão ruim, lenta ou limitada pode ser quase tão excludente quanto a ausência total de sinal.
Celular virou regra, mas com limites
A internet, para boa parte da população, ainda depende de plano pré-pago no celular. E aí mora o problema.
Quando o pacote acaba, e isso acontece com frequência, muita gente fica sem acesso ao básico. A pesquisa aponta que 64 milhões de brasileiros passaram por isso nos últimos três meses.
Em alguns casos, só dá pra usar aplicativos patrocinados. É o tal do zero rating, que permite acesso gratuito a determinados apps mesmo sem dados.
Para quem vive nas classes D e E, isso virou rotina: 41% seguem usando apenas apps liberados quando o plano expira. Já 39% ficam completamente sem acesso.
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Sem computador, sem chance
Outro abismo aparece no tipo de equipamento disponível. Se a casa tem computador, as chances de uso mais amplo da internet crescem. Mas só 10% dos domicílios das classes mais baixas contam com computador.
Na classe A, esse número beira os 100%. A diferença no aproveitamento é gritante: com computador, 69% das pessoas o usam. Sem ele, só 8% conseguem utilizar algum, seja na escola, no trabalho ou em lan houses.
A conectividade, portanto, não se resume ao wi-fi ligado. Envolve também o tipo de aparelho, velocidade da conexão, locais de uso e até o custo da mensalidade.
Quando estar conectado não é o bastante
A TIC Domicílios traz um termo que ajuda a entender esse cenário: conectividade significativa. Estar online é um passo, mas estar bem conectado é outra história.
Apenas 20% da população está no nível mais alto de qualidade de conexão. A maioria navega com restrições, seja de velocidade, de dados ou de dispositivos.
E esse dado preocupa: a parte da população que está melhor conectada não cresce. Estagnou. A parte com acesso mais frágil, por outro lado, diminuiu um pouco. O cenário melhora num ponto e emperra no outro.
Regiões e perfis ainda fazem diferença
Em áreas rurais e na Região Norte, o cenário é mais crítico. Um em cada quatro usuários dessas localidades ficou completamente sem acesso a aplicativos quando os dados acabaram.
Em contraste, nas regiões mais ricas, isso é muito menos comum. Há ainda diferenças entre brancos e pretos, entre quem estudou mais e quem estudou menos.
O acesso existe, sim. Mas a maneira como ele se dá muda radicalmente conforme a renda e o endereço. A internet está em mais lares, 86% no total, mas boa parte da população ainda navega com freios puxados.
A internet chegou, mas a inclusão ficou pelo caminho
O avanço no número de lares conectados é real, mas está longe de ser suficiente. Sem planos mais acessíveis, dispositivos em casa e velocidade decente, o uso pleno da internet continua restrito a uma parcela do país.
O Brasil precisa ir além do sinal. É hora de olhar para o que as pessoas conseguem fazer com a internet, não só se ela está disponível. Conexão por si só não resolve. É preciso garantir que ela funcione, alcance e transforme.




