19/04/2024

Para crescer, teles escanteiam pré e apostam forte no pós-pago

Operadoras passaram a cortar a internet de usuários pré-pagos após um limite de utilização. Já os planos de conta estão cheios de regalias, com benefícios ilimitados e ampla divulgação. Até a Vivo cedeu e está oferecendo envio de torpedos ilimitados para qualquer operadora no plano Controle. Apenas coincidência, ou mudança de estratégia?


O setor de telefonia móvel está sempre passando por mudanças, e o pré-pago sempre foi utilizado pelas operadoras para ganhar mercado. Mas, e quando a base de assinantes fica saturada e não há mais para onde crescer e ganhar dinheiro em planos de recarga? É aí que entram os planos controle e de conta (pós-pagos).

O termo ‘pós’ quer dizer ‘após’, portanto um plano pós-pago oferece ao consumidor a possibilidade de pagar depois o que utilizou. É como se fosse um empréstimo fornecido pela operadora, que será pago no fim do mês de utilização. É uma boa ideia para as operadoras, pois o assinante mantém o compromisso de efetuar um pagamento todos os meses pelos serviços prestados a ele. Claro que há risco de calote dos consumidores, mas quando a dívida é paga, o dinheiro vai direto para os cofres das teles.

No pré-pago não existe compromisso, o que é ruim para as empresas. Elas não tem como prever se irão arrecadar um valor x ou y, já que dependem do número de recargas feitas. Além disso, nem tudo o que é recarregado vai direto para as operadoras. Existe a comissão do lojista, da empresa PDV que fornece as recargas para o lojista, e depois o que sobra, a maior parte, vai para a operadora. É uma logística que demanda custos e cuidados. A vantagem é que não existe risco de alguém consumir e não pagar o que usou. ‘Pré’ significa antes, ou seja, o cliente paga antes de utilizar, e só usa aquilo que já pagou antecipado.

Promoções arrasadoras no pré-pago parecem que tiveram seus momentos bons. A Oi causou tumulto no ano de seu lançamento (2002) ao anunciar gratuidade nas ligações para outro Oi local durante 31 anos. Para participar bastava recarregar o celular com valores a partir de 1 real. Apesar de não ter uma estrutura de rede completa montada, a empresa do Grupo Telemar formou sua base rapidamente nas grandes cidades justamente graças ao Oi Cartão (plano pré-pago). A Oi logo foi encarada como a grande responsável por popularizar a telefonia móvel nos estados onde atuava (16 ao todo), e ficou conhecida como a ‘operadora do povão’. Vivo, Claro e TIM apenas vendiam recargas que variavam de R$ 20 a R$ 50, dinheiro que anos atrás valiam bem mais do que hoje, sendo vistas como as operadoras da elite.

Mas teve empresa da elite que mudou sua estratégia no meio do caminho e passou a focar no pré-pago para crescer: foi a TIM. Ao ver o número de clientes de sua base ‘fugindo’ para o pré-pago da Oi – principalmente no Nordeste, Norte e parte do Sudeste, a sua controladora Telecom Italia enviou o executivo Luca Luciani ao Brasil em 2009 para tentar encontrar uma solução. Luciani, na época presidente da TIM Brasil, convocou todo o seu setor de marketing para ao menos conseguir estancar as perdas de clientes da base da operadora. Foi aí que tiveram a ideia de lançar no mercado o plano Infinity Pré, simplesmente a melhor oferta de telefonia celular lançada naquele período. Afinal, a pessoa pagava 25 centavos e podia falar sem parar com qualquer celular TIM do Brasil, uma revolução no setor de ligações de longa distância pelo celular. Antes, as ofertas na telefonia móvel deixavam os usuários limitados a fazerem chamadas apenas para suas próprias áreas locais.

TIM cresceu sua base ao oferecer benefícios
ilimitados no pré-pago.
Depois que a TIM viu que as chamadas ilimitadas estavam surtindo efeito, resolveu investir ainda mais em outros segmentos do setor. Lançou o Infinity Torpedo, que liberou o envio de torpedos ilimitados para qualquer operadora do Brasil por 50 centavos por dia que usar. Teve também o Infinity Web, com internet liberada o dia inteiro também por 50 centavos. E todas essas novidades ganharam bastante espaço com comerciais e merchandising veiculados no horário nobre da Rede Globo, a maior rede de mídia do país, alcançando até as camadas mais pobres da população. Ninguém era acostumado a enviar mensagem, que dirá várias delas por um valor tão pequeno. E o que dizer da internet? As tarifas eram cobradas por cada Kb (quilobyte) utilizado, e não era nem um pouco barato. A base da TIM foi se alargando, alargando, alargando… até que ameaçou a Claro.

Foi aí que a Claro viu que teria que ser necessário ‘descer do salto’ para não perder a segunda posição do mercado para a TIM. Lançou a oferta “Fala Mais Brasil por Chamada“, uma espécie de cópia do Infinity da TIM, para mostrar que também poderia oferecer algo semelhante a da rival. Foram lançadas também a possibilidade de enviar centenas de torpedos por um valor fixo diário e acesso à internet. Só que a Claro não quis comprometer a sua rede e arriscar tanto como fez a TIM. As ligações ilimitadas não eram de fato ilimitadas: eram cobrados 21 centavos para cada 30 minutos de chamada para Claro de todo o Brasil. Para fixo, eram cobrados 50 centavos para cada 10 minutos. O envio de torpedos também não era ilimitado: era possível enviar no máximo 300 torpedos por dia. E a internet era anunciada como por 39 centavos por dia, mas na realidade eram tarifados R$ 11,90 por mês, quer o cliente utilizasse todos os dias, quer não. Provavelmente se essa promoção fosse lançada pela Claro primeiro que a oferta da TIM, ela ganharia bastante mercado, afinal, era uma revolução. Mas já existia algo melhor lançado pela TIM, e ilimitado de verdade. Todas essas limitações não agradaram o público e a Claro acabou perdendo a vice-liderança para a TIM.

A Vivo nunca se esforçou em cativar o público do pré-pago. Enquanto Oi, TIM e Claro acirravam a disputa para crescer em número de clientes, a já líder e poderosa Vivo apenas observava de longe toda a movimentação. Com clientes valiosos como Xuxa, Luciano Huck e a grande elite brasileira, a Vivo estava preocupada mesmo era na sua rentabilidade. Nunca ofereceu envio de torpedos ilimitados para qualquer operadora. Nunca ofereceu ofertas para pré-pago que exigissem recarga mínima abaixo de R$ 25 a nível nacional, muito menos liberava ligações ilimitadas para qualquer um. A operadora só lançou uma promoção com benefícios ilimitados em seis estados nordestinos, porque nesse caso a preocupação não era rentabilidade, mas sim ganhar mercado na região mesmo. Com exceção dessa parte do Nordeste, até hoje a Vivo não oferece benefícios ilimitados no pré-pago. Tudo é muito cronometrado. Até a internet banda larga móvel pré-paga da operadora, que teve que ceder para acompanhar o mercado, foi a primeira a passar a ser cortada ao atingir um certo limite. No entanto, a Vivo continua sendo a mais rica do Brasil, onde as ações na Bolsa de Valores chegam a valer mais de R$ 50. TIM e Oi, por exemplo, tem ações cotadas a R$ 12 e R$ 6, respectivamente.

Mas pare e pense: é impressão de todo mundo, ou a movimentação no mercado e novidades pararem de acontecer no pré-pago? Tudo está piorando. A Oi não possui todo aquele prestígio de antes, com promoções confusas e taxas de manutenção da oferta. A TIM aumentou significativamente suas tarifas para serviços ilimitados. A internet subiu de 50 para 75 centavos por dia. Os torpedos ilimitados receberam o mesmo aumento. Claro e Oi acompanharam o reajuste de torpedos e internet. A TIM descontinuou a oferta de chamadas ilimitadas por 25 centavos na maioria das regiões que atua, e passou a cobrar 75 centavos por dia para ligações ilimitadas. É como se estivesse vendendo um plano com ligações ilimitadas a R$ 22,50 por mês. O TIM Beta, fenômeno lançado pela TIM para atrair jovens, começou com tarifação de 10 centavos por dia por serviço utilizado. Mesmo que alguém utilizasse ligação, torpedo e internet o dia inteiro, não pagava mais do que R$ 6 por mês. As recargas duravam meses. Hoje o TIM Beta tem tarifas que chegam a custar R$ 67,50 por mês para quem usar todos esses três principais serviços todos os dias. Que decadência!

A maioria dos planos de internet pré-paga hoje sequer continuam ativos após o consumo das franquias, que são míseras, diga-se de passagem. Se você utiliza um serviço de streaming, como o Spotify, para ouvir músicas, trate de baixar tudo o que quiser ouvir enquanto estiver usando o WiFi de casa, porque na rua, você só vai conseguir escutar no máximo duas músicas com os 10MB diários que as operadoras oferecem.

E então, o que as operadoras querem agora com tanta limitação, regras e reajustes no pré-pago? Não existe mais espaço para crescer nesse mercado? Ou melhor, não existe mais espaço para ganhar dinheiro com o pré-pago? Será que toda novidade que for apresentada fará as operadoras perderem dinheiro?

Pós-pago em foco


Saturar a rede com muitos clientes deixou de ser um bom negócio para as teles. A preferência agora é receita, lucro, achar clientes que sejam rentáveis. As companhias de telefonia celular do Brasil, todas estrangeiras (com exceção da Oi), aparentam ser as grandes vilãs da história. “Só pensam no lucro, nunca no bem do consumidor, tem serviços que são péssimos e que não valem reajuste nenhum” podem pensar e esbravejar muitos consumidores. Mas os brasileiros podem também ter culpa no cartório. Ao reclamarem tanto dos serviços prestados, as operadoras que estavam oferecendo planos ilimitados passaram a receber uma série de multas e ordens do governo para melhorar a qualidade da rede. Mas ora, se uma operadora já está gastando muito dinheiro com seu marketing agressivo a ponto de lançar uma promoção para o povão (vamos dizer assim), porque será que ela vai se preocupar em gastar ainda mais com a qualidade de sua rede? Sejamos sinceros, as operadoras não lançaram promoções agressivas porque estavam sendo bondosas. O foco era não perder mercado para aquela que se aproximava. A TIM só lançou o Infinity por causa do sucesso da Oi, que começava a ameaçar sua terceira colocação. A Claro só se movimentou após ver a TIM chegar muito próximo da sua vice-liderança. Sempre foi assim! Ao se verem obrigadas a gastar com investimentos nas redes, uma hora ou outra as operadoras iriam repassar esses custos para o consumidor, que não satisfeito, exige ainda mais qualidade para justificar esses reajustes.

Parece até uma indireta ou alfinetada nos usuários, mas quando um diretor da Vivo foi falar sobre o fim da velocidade reduzida, ele justificou a mudança dizendo: “Há muitas ligações para o call center e o consumidor entendeu que estamos querendo oferecer um serviço de qualidade […] O cliente usa, não paga e reclama da qualidade do serviço. Para nós, os recursos estão sendo usados sem a remuneração necessária […] Velocidade reduzida foi um erro.”

Coincidentemente – ou não -, ao passo que os planos pré-pagos foram perdendo benefícios, os pós-pagos, principalmente os controles, ganharam uma publicidade bem maior das empresas. A TIM apresentou o Liberty Controle Express, que por um valor fixo é possível falar ilimitado com qualquer TIM do Brasil, enviar torpedo, ouvir música, acessar à internet…. A Oi apresentou planos controle mais flexíveis, também com diversos serviços ilimitados. A Vivo garante que suas chamadas para Vivo de todo o Brasil são ilimitadas no Vivo Controle, e até torpedos ilimitados para qualquer operadora foi liberado neste tipo de plano. A Claro também tem divulgado bastante seus planos pós-pagos. Na televisão, se vê mais propaganda do Claro Up e Claro On Line do que do Claro Pré Ilimitado. E o melhor: nos planos pós-pagos não existe o incômodo de ter sua navegação na internet cortado após atingir a franquia contratada. Será que não foi proposital? Se foi, a estratégia está dando certo.

Dados da consultoria Teleco mostram que a participação do pré-pago caiu de 82,5% em 2009, para 75,8% em 2014.



No ano passado, Vivo, Claro, Oi e Nextel ativaram tantas linhas pós-pagas, que o número chegou a ultrapassar as adições de pré-pago de todas as cinco maiores operadoras de celular juntas.


Num mercado que agora parece ter ‘virado a casaca’ para os planos de conta, o que você vai fazer? Seguir a multidão e debandar para o lado direito: a elite pós-paga, com ofertas irresistíveis e benefícios ilimitados? Ou bater o pé no lado esquerdo e esperar novidades, como a volta da queda nas tarifas do pré-pago?



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